Página Principal






 



Os objectivos ATTAC



Como já foi referido pela edição portuguesa do Le Monde Diplomatique, o movimento de opinião internacional conhecido por ATTAC passou a contar com uma plataforma em Portugal. Esta plataforma juntou neste seu começo, para além de muitas pessoas a título individual, o Le Monde Diplomatique (edição portuguesa), o Sindicato dos Jornalistas, a FENPROF, a AMPECS (Associação dos micro e pequenos empresários do centro e sul), a Associação "Abril" e o Movimento Católico dos Estudantes e visa o esclarecimento sobre medidas de combate às desigualdades a nível mundial, e em particular a aplicação da "taxa Tobin". Sobre esta "taxa", as suas implicações e a sua relação com o aparecimento da ATTAC em Portugal recomendo a leitura de um excelente e sintético dossier de Luís Rego e Manuel Esteves no Diário Económico de 15 de Setembro passado. Sublinho apenas o facto de uma ideia como a de fazer incidir sobre todas as transacções no mercado de divisas de um imposto simbólico de 0,1% cujo resultado deveria ser aplicado directamente no combate à pobreza no mundo é particularmente mobilizadora. É uma ideia concreta, clara, justa, moderada e realizável. Não que seja de simples realização, já que implica uma decisão no plano internacional e medidas que evitem a evasão. Mas nesta ideia associa-se o combate a transacções especulativas à possibilidade de constituir um fundo cujo destino é irrecusável. Para mais, trata-se de uma taxa que, pelo seu valor, não afecta o investimento.
Dois aspectos devem, entretanto, ser valorizados.

O facto de a taxa proposta ter um carácter simbólico não facilita a receptividade por parte de quem controla os mercados. É justamente a sua força simbólica que justifica as resistências. Uma tal medida teria o significado de inverter a tendência para a total desregulamentação das transacções financeiras internacionais. Seria um sinal para a possibilidade de os povos resolverem exercer algum controle, ainda que modesto, sobre mecanismos que têm escapado completamente à sua vontade e aos seus interesses.

Outro aspecto a valorizar é o das virtualidades do próprio movimento, a possibilidade de, a nível internacional, se criarem espaços de mobilização que recoloquem em primeiro plano a ideia de que as populações devem participar nos processos de decisão política que as afectam. Tem-se assistido crescentemente à entrega da decisão política a instâncias e grupos que nunca se submetem ao juízo dos cidadãos. Os povos são bombardeados com a ideia de que as coisas "são como são" e incentivados a aceitar passivamente as orientações dessas instâncias, quaisquer que sejam as cores dos seus governos. Há quem veja como inevitável que os mercados financeiros, e em particular os mecanismos especulativos, determinem, contra a vontade expressa pelas populações, os rumos das políticas económicas e os sacrifícios mais violentos aos povos. Ora, pelo contrário, há que romper com essa passividade e um movimento de opinião como o ATTAC é um instrumento para que isso aconteça.

Como ficou patente nos encontros mundiais que a ATTAC promoveu em Paris em Junho passado, as preocupações deste movimento vão muito para além da aplicabilidade de uma só proposta concreta. A primeira dessas preocupações era a troca de experiências. Assim se puderam ouvir os testemunhos dos "sem terra" brasileiros, dos desempregados franceses, de professores do Senegal, do Benin, do México ou da Argentina, de antigos prisioneiros políticos de Marrocos e da Indonésia. Trocaram-se pontos de vista sobre os problemas da comunicação, sobre a utilização dos meios tradicionais, nomeadamente a rádio e a imprensa, e as experiências concretas da utilização da Internet pelos movimentos sociais. No âmbito da educação, foram fortemente criticadas as políticas de desinvestimento público, patrocinadas pelo Banco Mundial e referidas diversas formas de luta actualmente em curso. Discutiram-se, assim, temas tão diversos como a crise económica, a criminalidade financeira, os problemas da dívida externa, os problemas das minorias, dos recursos naturais, das formas de comunicação alternativa, das questões dos saberes e do ensino. Neste conjunto de preocupações integra-se a reflexão que levou às dezenas de manifestações convocadas sob o lema "O mundo não é uma mercadoria" em França, Bélgica, Suiça e Suécia, a propósito da Conferência da OMC em Seattle e que também motivou um comunicado da plataforma portuguesa.

Outra grande vantagem deste movimento vem-lhe da sua diversidade. Alguns exemplos da vivacidade das discussões em curso: deve-se propor a reforma das instituições financeiras internacionais ou deve-se trabalhar para a construção de alternativas? Deve-se apoiar sem condições a anulação das dívidas externas dos países mais pobres ou, pelo contrário, deve-se associar tal iniciativa à satisfação de reivindicações dos movimentos democráticos existentes nesses países? Como avaliar a experiência da Malásia, onde medidas adoptadas à revelia das ordens do FMI parecem estar a resultar, mas onde a realidade política levanta fortes críticas?

Por estes exemplos se vê a relação estreita entre as respostas à urgência provocada pela exclusão crescente e a discussão de perspectivas políticas de maior fôlego.

Estes são também os desafios que se colocam em Portugal. Ousar enfrentar as contradições necessárias para a mobilização a favor de um mundo melhor do que o actual. Endereços: portugal@attac.org e www.attac.org/portugal

João Luís Lisboa

(publicado na edição portuguesa do Le Monde Diplomatique, Dezemb. 99)




página principal
iniciativas | documentos | adesão | notícias | links