Manifesto por uma Europa Social
Cimeira Alternativa
Lisboa - 24 Março 2000
Programa
!!!
A realização em Portugal, nos próximos dias 23 e 24 de Março, de uma
cimeira da União Europeia centrada no tema do emprego, será um dos pontos
altos da presidência portuguesa da UE. Tal não significa, porém, que
haja razões para esperar alguma mudança significativa nas políticas
sociais e económicas que vêm sendo seguidas em Portugal e na Europa.
Os problemas com que actualmente nos defrontamos, os níveis de desemprego,
a crescente precaridade dos vínculos laborais, a perda de direitos,
os fenómenos crescentes de exclusão, são tanto mais chocantes quanto
se assiste a manifestações de poder cada vez mais concentrado nas transnacionais
e em organismos internacionais cuja responsabilidade na situação referida
tem sido amplamente denunciada, e quando a mesmo tempo os países da
União Europeia e os que são membros da NATO prosseguem a corrida aos
armamentos, incluindo o nuclear, gastando recursos fabulosos que contradizem
a chamada coesão económica e social.
Inverter esta situação é não só viável, mas absolutamente necessário,
partindo de propostas concretas e não apenas de declarações de intenções.
Reafirmamos o trabalho com direitos como um valor essencial da civilização,
um valor que exige o combate às diversas formas de exclusão que o actual
processo de globalização vem agravando. Este processo, ao colocar a
liberdade das empresas à frente da liberdade e dos direitos dos povos
e dos cidadãos, é gerador de desigualdades e desequilíbrios sociais
e ecológicos intoleráveis.
De facto, milhões de pessoas têm sido empurradas para o desemprego,
crescentemente de longa duração, ficando, em consequência, privadas
de elementares direitos de cidadania.
Os jovens, quando entram no mercado de trabalho, fazem-no em condições
de precaridade extrema, que se arrasta muito para além do chamado “período
de experiência”.
E são altamente preocupantes a desertificação dos campos, o declínio
da agricultura, os atentados ao ambiente e o esgotamento de recursos
provocados pela desregulação económica, pela nova Política Agrícola
Comum (PAC) e pela extensão das orientações da Organização Mundial do
Comércio (OMC) ao sector agrícola.
Mas a rejeição das várias formas de exclusão e de restrições no acesso
ao emprego e à cidadania traz, para o mesmo plano, responsabilidades
mais vastas que devem ser assumidas:
- a luta pela igualdade de oportunidades sem quaisquer discriminações
baseadas na nacionalidade, sexo, etnia, religião, deficiência, orientação
sexual ou opiniões políticas;
- a defesa de condições de vida e de realização profissional para as
pessoas com deficiência;
- a recusa do racismo e da xenofobia, que implica a legalização dos
imigrantes, o reconhecimento de direitos políticos e sociais dos cidadãos
que vivem e trabalham num país e do direito ao asilo;
- o reconhecimento de que a integração social dos reclusos não é substancialmente
diferente da integração de outras populações excluídas, nomeadamente
no acesso ao trabalho;
- a valorização da importância social da maternidade e da paternidade,
o desenvolvimento de políticas de apoio à criança e às famílias, banindo
o trabalho infantil e a violência contra as mulheres, o respeito dos
direitos sexuais e reprodutivos e da opção das mulheres de interromperem
uma gravidez não desejada;
- o assumir do ensino como um bem a desenvolver, como uma responsabilidade
que os poderes públicos devem assumir numa perspectiva de ligação entre
a escola e a vida activa;
- o combate à fraude e à evasão fiscal, tributando os movimentos especulativos
de capitais, nomeadamente através da adopção de medidas internacionais
como a taxa "Tobin" e o fim dos paraísos fiscais, e de medidas a nível
nacional como o fim do sigilo bancário.
Porque existem muitas vozes, ideias, posições e práticas que, sendo
diversas, são expressão de um pensamento que se distingue claramente
das orientações neoliberais prevalecentes;
Porque é necessário fazer convergir essas expressões, numa atitude de
abertura crítica, potenciando a acção de movimentos sociais e a adopção
de programas e de políticas que invertam as prioridades das políticas
actuais, colocando os interesses dos povos à frente dos interesses particulares
de alguns grupos:
Dirigimos a todas as organizações sociais, associações cívicas e culturais
e personalidades que se revejam nestes princípios um apelo à participação,
no dia 24 de Março, de uma Cimeira Alternativa por uma Europa Social
e a um compromisso por um combate quotidiano na construção de uma sociedade
mais justa e solidária.
Lisboa, 21 de Fevereiro de 2000
Contactar o secretariado
da Cimeira Alternativa